sexta-feira, 29 de abril de 2011

ZECA AFONSO - O POETA TROVADOR DA REVOLUÇÃO DOS CRAVOS

Revolução dos Cravos é o nome dado ao golpe de estado militar que derrubou, num só dia, sem grande resistência das forças leais ao governo - que cederam perante a revolta das forças armadas - o regime político que vigorava em Portugal desde 1933.
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O cravo vermelho tornou-se o símbolo da Revolução de Abril de 1974; Com o amanhecer as pessoas começaram a juntar-se nas ruas, solidários com os soldados revoltosos; alguém (existem várias versões, sobre quem terá sido, mas uma delas é que uma florista contratada para levar cravos para a abertura de um hotel, foi vista por um soldado que pôs um cravo na espingarda, e em seguida todos o fizeram), começou a distribuir cravos vermelhos para os soldados, que depressa os colocaram nos canos das espingardas.

O CLICHÊ DA GRANDE IMPRENSA

O professor de jornalismo Eugênio Bucci vive apregoando pelos quatro cantos a defesa de um jornalismo isento, com base na verdade, objetivo, não manipulado. E o que vemos em seu artigo O fundamentalismo do Estado cubano (O Estado de S. Paulo, p. A2, 21 de abril), que aborda o VI Congresso do Partido Comunista de Cuba recém realizado? Não há qualquer isenção, a verdade é agredida, a objetividade, esquecida, se enreda em fantasias tortuosas e a manipulação é grosseira.

Convido o leitor a percorrer o Herald Tribune, o El Nuevo Herald, o Diario de las Americas, porta-vozes em Miami das organizações cubano-americanas contrarrevolucionárias, e não encontrará sequer algo parecido em termos de desonestidade. Enfim, não é um texto de mestre da Escola de Jornalismo da USP (Universidade de São Paulo), e sim um panfleto que retrata sua atual inclinação ideológica.
O professor Bucci decretou a morte física e política de Cuba: “A renovação anunciada no congresso dos comunistas cubanos é a antessala da morte. Física e política". Não é o que pensa Catherine Ashton, Alta Representante de Política Exterior da União Europeia e vice-presidente da Comissão Europeia, a mesma que defende ardorosamente a participação dos países europeus na guerra civil da Líbia. A Europa Press informa que ela seguiu com interesse o Congresso e disse que a União Europeia celebra o anúncio de reformas econômicas feito pelo regime de Raúl Castro e considera que o anúncio do PCC (Partido Comunista de Cuba) “indica que há avanços significativos na frente econômica e apontam progressos remarcáveis também no plano político".

Aí o professor resolve debochar da história e dos personagens da história: “Na década de 1950, Raul e Machado Ventura davam tiros em Sierra Maestra.” Raul, 27 anos, Ventura, 28. Além desses dois, também ‘davam tiros’ Fidel, 32, Che, 30, Camilo, 27. Os tiros desses jovens guerrilheiros derrubaram o governo sanguinário, corrupto e repressor de Fulgêncio Batista e seu exército, apoiado por Washington e fizeram triunfar a Revolução Cubana. Esses mesmos heróicos combatentes foram os mesmos que, há 50 anos, na Playa Girón, infligiram a primeira derrota do imperialismo na América. E a América Latina toda ficou um pouco mais livre e independente.

Diz mais o professor que “em Cuba, o Estado geriátrico é o reflexo do envelhecimento do regime”. Deve ou deveria ter visto por canais interativos, You Tube, Telesur e outros, o desfile militar e a marcha dos habitantes de Havana na manhã de 14 de abril. Somente alguém insensível ou movido pela intolerância e pelo ódio político não se sentiria tocado pelo entusiasmo de imensos contingentes juvenis e estudantis diante de uma multidão de centenas de milhares que tomou a gigantesca Praça da Revolução. Não marchavam para protestar nem para pedir a renúncia do governo, e sim para apoiá-lo, alentá-lo e para dizer que seguem em frente na defesa do socialismo.

O presidente Raul Castro expôs no Congresso, com a dureza necessária, algumas questões fulcrais: uma deles é modificar a mentalidade, quebrar esta barreira psicológica nos quadros do partido, como pré-condição para a efetivação das grandes mudanças propostas. A outra a incapacidade, que Raul chamou de vergonha, de ir criando quadros para substituir a geração histórica. O novo Comitê Central de 115 membros já registra uma renovação profunda em termos etários e uma proporcionalidade próxima da realidade demográfica no número de mulheres, negros e mestiços.
O professor sustenta que “Cuba só se converteu na tirania que é hoje – caquética, mas de pé – porque soube transformar a militância que a sustenta, dentro e fora da Ilha, numa seita religiosa” Que seita religiosa é essa que durante três meses, de primeiro de dezembro de 2010 a 28 de fevereiro, decidiu discutir os “dogmas”, desencadeando um debate, no qual participaram 8 milhões 913 mil 838 pessoas, parte delas repetida - em mais de 163 mil reuniões efetuadas no seio de diferentes organizações, registrando-se uma una cifra superior a três milhões de intervenções.

Foi um verdadeiro e amplo exercício democrático, o povo manifestou livremente suas opiniões, esclareceu dúvidas, propôs modificações, expressou suas insatisfações e discrepâncias e também sugeriu abordar a solução de outros problemas não contemplados no documento.

Com isso mais de dois terços dos parágrafos foram emendados com contribuições partidas da base. Significativo contraste com o que se pratica nas democracias de livre mercado onde, despoticamente, sem consulta alguma aos afetados, se hipoteca o futuro de gerações com os planos de ajuste e “reformas” de modo a continuar enriquecendo uma elite insensível e ambiciosa.

O professor Bucci, do alto de sua cátedra, determina que “o capital deve conseguir seu visto de entrada nos domínios dos Castros, mas para lá vai mandar apenas o seu lado selvagem: desemprego, especulação, insegurança”. A resposta do governo da Revolução, reafirmada no VI Congresso, é que não deixará nenhum cubano desamparado e o sistema de atenção social se está reorganizando para assegurar a proteção diferenciada e racional daqueles que realmente necessitem. Em vez de subsidiar maciçamente produtos, como se faz agora, se passará progressivamente ao apoio de pessoas sem outro meio de sustento.

Como Bucci insiste na “decrepitude do PCC” vale lembrar que o Birô Político reflete uma adequada proporção de chefes principais das Forças Armadas Revolucionárias. É natural que assim seja, pois o Exército Rebelde foi a alma da Revolução, transferindo posteriormente ao partido e ao exército a defesa das conquistas da revolução. Hoje uma das preocupações centrais ainda é a defesa da soberania, da independência de Cuba, e fazer ver a setores externos que Cuba está disposta a tudo para defender seus ideais. O Birô Político se compõe de 15 membros. Nele ingressaram três novos membros: Mercedes López Acea, 46, Primeira Secretária do Comitê Provincial do partido em Havana; Marino Murillo Jorge, 51, vice-presidente do Conselho de Ministros e Chefe da Comissão Permanente do Governo para a Implementação e Desenvolvimento e Adel Yzquierdo Rodríguez, 63, recentemente nomeado Ministro de Economia e Planificação.
A média etária do Birô Político é de 67 anos e vale lembrar que a Conferência do partido em janeiro próximo, recebeu do Congresso a responsabilidade de abordar a fundo o problema da renovação. E se só de idade se tratar, poderia trazer à baila uma comparação. O Sr. José Serra teria hoje como presidente da República – se ganhasse as eleições, é claro – 69 anos, dois a mais que a média do colegiado acima.

Finalmente, o professor Bucci expressa que “em Cuba não é todo o poder que emana do povo” e que a Constituição cubana consagra “o princípio do expansionismo internacional da doutrina que professam e a identificação clara do inimigo, cuja figura maligna serve para justificar a supressão das liberdades internas.” Ele sabe, porque à época estava mais próximo dos ideais da Revolução Cubana, que há muito Havana abandonou a doutrina da “exportação da revolução”.

Quanto ao inimigo, que Bucci em nenhum momento menciona com todas as letras como se não fosse real e que não tivesse desde os primórdios do triunfo da revolução estabelecido um bloqueio político, econômico e financeiro e que ao logo dos anos patrocinou invasões, sabotagens, assassinatos, provocações, ingerências. Ou o ilustre professor acha que nos Estados Unidos o poder emana do povo quando se trata de fazer guerra, invadir países, defender déspotas, e mesmo abonar o sistema financeiro com trilhões, e não do complexo militar-industrial - expressão cunhada pelo presidente Eisenhower – e seus representantes no parlamento. Bastaria recordar ao Sr. Bucci o conteúdo de um memorando secreto, desclassificado em 1991, do Subsecretário Adjunto de Estado para os assuntos interamericanos, Lester D. Mallory, de 6 de abril de 1960. Cito textualmente:: “A maioria dos cubanos apoia Castro [...] Não existe uma oposição política efetiva [...] O único meio possível para fazê-lo perder o apoio interno [ao governo] é provocar o desengano e o desalento mediante a insatisfação econômica e a penúria [...] Há que se pôr em prática rapidamente todos os meios possíveis para debilitar a vida econômica [...] negando a Cuba dinheiro e fornecimento de bens com o fim de reduzir os salários nominais e reais, com o objetivo de provocar fome, desespero e o derrocamento do governo”. Observem a data do memorando, 6 de abril de 1960, quase um ano antes da invasão de Playa Girón.

Desconfio que na raiz desse comportamento raivoso de Bucci e de outros articulistas recém-embarcados no neoliberalismo e da grande mídia em geral está a determinação do governo de Cuba, manifestada nas palavras de Raul Castro, que assumiu sua última tarefa com a firme convicção e compromisso de honra de que o Primeiro Secretário do Comitê Central tem como missão principal e sentido de vida defender, preservar e prosseguir aperfeiçoando o socialismo e não permitir jamais o regresso do regime capitalista.
DONTE: Opera Mundi

O LEGADO MARXISTA E A LUTA POLÍTICA NA AMÉRICA LATINA

O legado marxista e a luta política na América Latina

Ivan Pinheiro *

Em primeiro lugar, agradecer o honroso e irrecusável convite para participar deste importante seminário, que se propõe a trazer o legado de Marx para colocá-lo a serviço da luta de classes, em especial na América Latina, e não apenas para uma discussão meramente acadêmica ou diletante.

A vasta obra de Marx e Engels é a principal contribuição para nós revolucionários entendermos a natureza do capitalismo e identificarmos os aliados e inimigos de classe do proletariado, levando em conta a conjuntura e a correlação de forças, em cada época, em cada país. Conhecendo nossos inimigos e aliados, à luz dos ensinamentos de Marx, podemos acertar mais do que errar, na luta para destruir o estado burguês e emancipar o proletariado.

Do ponto de vista da ação, das contradições do capitalismo e da luta política, podemos afirmar que o MANIFESTO DO PARTIDO COMUNISTA, que Marx compartilhou com Engels há 163 anos, continua tão atual quanto fundamental como contribuição aos partidos que lutam pela revolução socialista.

Marx está vivo quando se confirmam suas análises de que o capital extrapolaria seus limites nacionais, assumindo dimensão mundial e aumentando, quanto mais senil, suas tendências destrutivas frente à humanidade. Nunca foram tão expressivas e inconciliáveis as contradições entre a apropriação privada do capital e o caráter social da produção e portanto tão agudas as crises cíclicas de superprodução, agora com características estruturais, em que não se distinguem, temporalmente, ciclos, mas novas manifestações de uma mesma crise sistêmica. Trata-se de uma crise global, que Jorge Beinstein chama de crise da civilização burguesa, multifacética, em que os EUA estão no epicentro. Trata-se de uma crise do modo de produção capitalista.

A CRISE DO CAPITALISMO:

A crise sistêmica do capitalismo gera necessidades cada vez maiores de reprodução do capital. Disputas de mercados, escassez de fontes energéticas e recursos naturais atiçam as contradições inter-burguesas e empurram o imperialismo para novas aventuras militares. Estamos assistindo guerras imperialistas no Iraque e no Afeganistão, e agora na Líbia, e as tentativas de se abrirem novos focos de conflito, como no Irã, na Síria, na Coréia do Norte, além da continuidade da ocupação palestina.

Para tentar sair da crise, o capital saqueia os cofres públicos para salvar banqueiros e oligopólios; ataca os direitos sociais e trabalhistas, diminui a qualidade dos serviços públicos; aprofunda a exploração e a barbárie, a fome e a miséria. Para tal, recrudescerão a criminalização e a repressão aos movimentos sociais e às organizações populares e revolucionárias.

Esta crise, apesar de seus elementos estruturais, não é, por si só, a crise final do capitalismo, que não cairá de podre. Mas, dialeticamente, poderá criar as condições - com o provável acirramento da luta de classes em âmbito mundial – para colocar em relevo o protagonismo do proletariado e, a depender de certos fatores, influenciar positivamente a correlação de forças, abrindo possibilidades para o avanço da luta pela superação do capitalismo, na perspectiva do socialismo.

Apesar da diminuição relativa e gradual de sua hegemonia econômica, cultural, política e ideológica, os EUA ainda detêm a hegemonia militar inconteste, o que lhes permite continuar como o pólo mais importante num mundo cada vez mais multipolar, ainda que no campo capitalista. No caso da América Latina, o imperialismo norte-americano é altamente hegemônico e o inimigo principal dos povos da região. Reconhecer isto não significa alimentar ilusões de escolhermos outros imperialismos, como se as contradições entre eles fossem significativas.

Os trabalhadores passaram as duas últimas décadas do século passado numa luta passiva, em função da avassaladora hegemonia do imperialismo, sobretudo o norte-americano. A desagregação da URSS teve um impacto arrasador, na medida em que deixou de ser um campo em que as forças progressistas e revolucionárias podiam obter apoio e que o mundo deixou de ser bipolar.

No entanto, os trabalhadores vêm aumentando a sua combatividade e os povos do Oriente Médio e do Norte da África se levantam contra tiranias, o imperialismo e o sionismo. Em várias partes, os trabalhadores retomam suas lutas e se colocam como vanguarda alternativa na luta de classes.

A CORRELAÇÃO DE FORÇAS NA AMÉRICA LATINA

A América Latina é uma das regiões do mundo em que a resistência retomou com mais força, apesar da heterogeneidade dos processos de mudança. Neste século, até por volta de 2008, as forças populares e anti-imperialistas contabilizavam mais avanços que retrocessos, sobretudo após a grande vitória do povo venezuelano, no fracassado golpe contra Chávez em 2002, talvez a primeira derrota golpista dos EUA na região.

Cuba não ficaria mais sozinha na luta contra o imperialismo. Sob a influência dos avanços na Venezuela, vieram as vitórias de Evo Morales, na Bolívia, e de Rafael Correa, no Equador.

Nesses três países, em que os processos de mudanças são os mais avançados, conseguiu-se, a partir de pressão popular, a convocação de Assembleias Constituintes livres e soberanas, que abriram espaços para avanços progressistas.

Num patamar intermediário, foram importantes neste período as vitórias da FSLN, na Nicarágua, e da FMLN, em El Salvador, e a manutenção da Frente Ampla no governo uruguaio.

Os governos dos Kirchner na Argentina, Michele Bachetel no Chile, Lula no Brasil e Lugo no Paraguai, com coligações heterogêneas, derrotaram forças reacionárias em seus respectivos países. No entanto, no nível macroeconômico e político, suas ações foram sempre no sentido de ampliar os interesses da burguesia de seus países, aumentando a presença e a exploração capitalista na região, contribuindo, assim, para uma afirmação burguesa no aparato de Estado.

As maiores vitórias desta fase foram o enterro da ALCA em Mar Del Plata, a reeleição de Chávez, a retirada da base norte-americana de Manta, no Equador, e a vitória de Evo Morales no referendo revogatório. A maior derrota foi o não no referendo constitucional na Venezuela, em dezembro de 2006. Todavia, é importante registrar o crescimento das lutas dos trabalhadores, dos grupos étnicos e da reafirmação da cultura originária em grande parte da América Latina.

O imperialismo estadunidense, percebendo que iam longe demais as mudanças onde considera seu quintal, retoma com intensidade a pressão sobre a região. Voltam-se, com intervenção política e aparato bélico, suas ações para a América Latina, sobretudo para a região andina. Trata-se de tentar, no plano tático, frear o processo de mudanças e, no estratégico, consolidar e expandir o controle sobre as riquezas naturais do continente, que são imensas. Além do petróleo e do gás, a América do Sul tem as maiores reservas de água potável e de biodiversidade do planeta: ao norte, a Amazônia; ao sul, o Aqüífero Guarani.

Uma das principais táticas utilizadas pelo inimigo foi estimular o separatismo, escolhendo cidades dominadas politicamente por setores burgueses de maior acumulação e que já têm rivalidades antigas com as capitais: Zulia (Venezuela), Santa Cruz de La Sierra (Bolívia) e Quaiaquil (Equador).

Não é à toa que a Quarta Frota da Marinha de Guerra dos EUA voltou a operar no nosso continente, após mais de 60 anos de inatividade.

Marco importante desta ofensiva ianque foi o assassinato do Comandante Raul Reyes, pelo consórcio político/bélico representado pelos EUA/Colômbia, num ataque terrorista ao território do Equador, cujo Presidente não se acovardou e resolveu defender a soberania de seu país. Ali se tratava de paralisar as trocas humanitárias na Colômbia, que poderiam criar um clima favorável a uma negociação política a respeito do conflito armado.

A satanização da insurgência colombiana e a interrupção das trocas humanitárias, estas à época lideradas por Chávez e a Senadora Piedád Córdoba, criam as condições para a instalação de mais sete bases militares na Colômbia.

O golpe em Honduras é parte importante da luta contra o fortalecimento da ALBA e a recuperação, como aliado dos EUA, de um país que tem uma das maiores bases da América Central (Sotto Cano) e que se localiza estrategicamente entre a Nicarágua e El Salvador. Depois veio o aproveitamento do terremoto no Haiti e a cumplicidade do governo da Costa Rica, para o imperialismo instalar mais tropas nesses países. É parte deste esforço para estancar as mudanças e atingir a ALBA a recente tentativa de golpe no Equador.

No Paraguai, já sabíamos das dificuldades que teria Lugo, se efetivamente quisesse promover as mudanças prometidas. Foi eleito como expressão de um movimento de massas débil, na esperança de derrotar os conservadores que governavam o país havia 41 anos e ainda estão no poder. Tendo passado mais da metade de seu governo, o movimento de massas não teve forças para empurrar as mudanças e tudo indica que o Presidente se entregou à direita e ao imperialismo, aceitando um pacto com a classe dominante para não ser derrubado por um golpe. Lugo já não governa. Espera apenas acabar seu mandato.

OS PRINCIPAIS INIMIGOS DO IMPERIALISMO NA AMÉRICA LATINA

CUBA

Dificilmente teria avançado tanto o processo de mudanças na América Latina se não fora o exemplo da cinqüentenária Revolução Socialista de Cuba, que mostrou a possibilidade de as classes dominadas enfrentarem e derrotarem o imperialismo e escolherem seu próprio destino.

Na década de 90 do século passado, após o colapso da URSS, Cuba passou por dificuldades econômicas que exigiram o sacrifício do “período especial”, uma vez que mais de 80% do seu comércio dava-se com a URSS e o Leste Europeu. Novas medidas políticas e econômicas foram adotadas para enfrentar tal situação, no sentido de prosseguir com a efetivação do socialismo, apesar do agravamento do cruel bloqueio que hoje já dura mais de 50 anos.

O surgimento dos processos de mudança na América Latina, sobretudo o da Venezuela, deu um novo alento e respaldo à Revolução Cubana.

Claro está que o processo de construção do socialismo em Cuba é extremamente complexo e vive um momento de grandes dificuldades. O maior desafio do povo cubano é justamente manter firme a decisão de seguir construindo sua experiência de socialismo.

Tudo indica que as medidas propostas pelo governo refletem as necessidades geradas pelo processo histórico atual. Rejeitamos as análises que dão como inevitável em Cuba o retrocesso ao capitalismo, como querem fazer ver os ideólogos representantes da burguesia e do imperialismo, que por inúmeras vezes já anunciaram a morte do socialismo cubano. Ao mesmo tempo, consideramos justas as preocupações, no campo revolucionário, quanto aos riscos de se abrirem brechas para a incidência da mais-valia.

É imperioso seguirmos solidários ao povo, ao governo e ao Partido Comunista Cubano e ao caminho revolucionário que os cubanos escolheram e desenvolveram a partir de 1959. O povo cubano é quem melhor saberá dizer como enfrentar seus problemas e continuará encontrando, com a coragem, a obstinação e a criatividade que lhe são peculiares, as saídas para a manutenção e o aprofundamento das conquistas obtidas no processo de construção da sociedade socialista.

A luta pelo fim do bloqueio e pela libertação dos Cinco Heróis é parte da principal pauta dos revolucionários de todo o mundo.

VENEZUELA

A queda da Venezuela arrastaria inexoravelmente as esperanças dos povos da América Latina. Seu triunfo, entretanto, pode mudar o curso da história.” (Fidel Castro)

Além de Cuba, o governo venezuelano é hoje, em nosso continente, o principal inimigo do imperialismo, pela inspiração a processos semelhantes em outros países, aos quais presta efetiva solidariedade política e material; pela defesa de Cuba Socialista e parceria com ela; pela contribuição decisiva para inviabilizar a ALCA e implantar a ALBA; por ter avançado mais em mudanças institucionais e estruturais; por ter resistido a vários golpes; por ter criado uma mídia alternativa à burguesa; por ter as reservas minerais mais importantes da região andina e por ter uma relação superior de respeito aos interesses dos trabalhadores em sua marcha a caminho do socialismo.

Até dezembro de 2006, com a derrota no referendo constitucional, a revolução bolivariana tinha uma trajetória ascendente, com grandes vitórias, como o golpe midiático (2002), o lockout petroleiro (2003), o referendo revogatório (2004) e a reeleição de Chávez (2006).

A única derrota da revolução bolivariana teve como principal causa o erro de tentar decretar o socialismo através de um referendo de uma proposta de reforma constitucional, redigida previamente e apresentada pelo Presidente Chávez e não por subscrição popular, sem uma ampla discussão prévia entre as massas. Mas a derrota teve a virtude de colocar em evidência todos os problemas da revolução.

Mas apenas os erros táticos e a ação dos agentes do imperialismo não seriam capazes de derrotar o governo, que contava com quase dois terços do eleitorado. Metade dos eleitores do governo se absteve no referendo, dando vitória à direita. É a correta análise desta abstenção que pode ou não ajudar a retomada e o avanço da revolução, a depender do enfrentamento de problemas não resolvidos até hoje.

Saltam aos olhos as duas principais causas da abstenção: a traição de setores vacilantes, oportunistas e até contrarrevolucionários que gravitam em torno do governo e o recado de setores populares, insatisfeitos com os rumos e o ritmo da revolução bolivariana, o chamado voto castigo. Um quadro parecido, apesar de não tão dramático, se deu recentemente nas eleições parlamentares, em que a direita teve um desempenho acima da esperada, elegendo mais de 40% do parlamento.

A situação da luta de classes na Venezuela caminha para um confronto, que poderá resvalar para a violência, em face da notória impossibilidade de conciliação entre projetos tão antagônicos. Ao que tudo indica, este desempate se dará após a realização das eleições presidenciais, em 2012. Não será uma simples eleição a que estamos acostumados na democracia burguesa tradicional, no campo do chamado “jogo democrático”, da “alternância de poder”.

Se Chávez perder, não será para setores de esquerda, mas para a direita ligada e financiada pelo imperialismo, que revogará todos os avanços e acabará com a ALBA. A repercussão na América Latina (e no mundo) seria desastrosa, um retrocesso muito grande, sem qualquer comparação, por exemplo, com a derrota de Bachelet no Chile.

Por isso, contribuir para a vitória de Chávez será um desafio para toda a esquerda conseqüente da América Latina. Por mais que algumas forças de esquerda, como o PCB, tenham restrições a alguns aspectos da revolução bolivariana e não sejam chavistas, esta será uma das principais batalhas em 2012. Esperamos que o papel da classe trabalhadora na defesa de seu projeto seja o elemento central da vitória de Chávez.

Sem dúvida, nos doze anos de Revolução Bolivariana produziram-se grandes avanços, como melhores indicadores sociais a partir das diversas Misiones, a construção ainda que limitada de mecanismos de poder popular, a nacionalização da PDVSA e de alguns monopólios privados, o fortalecimento do papel do Estado no setor financeiro e na política monetária e cambial. Valorizamos também grandes avanços na consciência anti-imperialista e mesmo anticapitalista de amplas camadas populares.

São inegáveis as evidências de que o Presidente Chávez está honestamente convencido da necessidade de construir o socialismo, mesmo cercado por um entourage heterogêneo em que, ao lado de socialistas, pontificam contrarrevolucionários e corruptos. Têm um grande peso na direção do Estado setores da chamada “boli-burguesia” e fundamentalmente da pequena burguesia, que não têm interesse em mudanças revolucionárias.

Por isso, não podemos fechar os olhos a alguns fatores que podem levar a retrocessos e até mesmo à derrota do processo de mudanças, com a volta ao governo dos círculos direitistas associados ao imperialismo contribuindo para o massacre do projeto popular.

A economia venezuelana continua sendo basicamente petroleira, sem avanços na diversificação e na substituição de importações. Trata-se de um país basicamente importador, inclusive de alimentos, com alta dependência tecnológica. Não têm sido desenvolvidas a contento, por outro lado, as iniciativas governamentais como as “empresas de produção social”, as cooperativas e pequenas empresas. Nas novas empresas criadas pelo governo e naquelas que foram estatizadas, a participação dos trabalhadores é insuficiente e formal. Em algumas, a direção foi apropriada por gerentes corruptos e ineficientes. A não participação dos trabalhadores na gestão dessas empresas pode gerar um ciclo de “capitalismo de Estado”.

Em resumo, para avançar na perspectiva socialista, a atual fase, que o PCV define como “social-reformista, patriótica e progressista” só poderá ser superada por uma nova correlação de forças em que setores populares e revolucionários, liderados pela classe operária, alcancem um nível necessário de consciência, unidade, organização e mobilização que lhes permitam impor sua hegemonia.

BOLÍVIA

Na Bolívia, há um fator que tem dado boas condições de governabilidade ao governo popular. Evo foi eleito de baixo para cima, no contexto de grandes mobilizações, como as Guerras do Gás e da Água, que haviam derrubado três presidentes burgueses.

Com a vitória no referendo revogatório de agosto de 2008, evitou-se, pelo menos por agora, o separatismo de Santa Cruz e um golpe de direita que estava em curso. O Presidente saiu fortalecido, consagrado em meio ao seu mandato, em referendo convocado por ele próprio, com 67% dos votos, 14% a mais do que quando foi eleito em 2005.

Mas é preciso ficar claro que quem derrotou o golpe e o separatismo foram as massas e que o processo não está imune a retrocessos, sobretudo se limitar-se aos aspectos culturais e democráticos, que são importantes, mas não decisivos na luta de classes.

Uma grande virtude do processo boliviano é a tradição de luta e de unidade da COB (Confederação Operária Boliviana).

EQUADOR

Como na Venezuela e na Bolívia, a mídia burguesa é o maior partido de oposição, coadjuvado pelas associações empresariais, partidos conservadores, a cúpula da igreja católica e ONGs financiadas pela USAID, sob a direção da embaixada norte-americana.

Rafael Correa, apesar de limitações, promoveu algumas mudanças. Começou com uma auditoria da dívida externa, que reconheceu apenas 30% do total até então cobrado pelos credores. A partir da pressão popular, efetivou-se uma Constituinte livre e soberana, independente do parlamento, propiciando uma nova constituição (promulgada em julho de 2008) avançada em termos de direitos sociais. Importantes medidas de Rafael Correa foram a determinação de retirada da base militar dos EUA e a integração de seu país à ALBA.

Correa também vem estatizando gradualmente a indústria petroleira, com a criação de um novo marco regulatório, em que o Equador retoma sua soberania sobre parte de suas riquezas e usufrui de seus rendimentos. Todavia, o governo Correa tem que sair do marco personalista, passando a agir em consonância com os trabalhadores do Equador, para que possa enfrentar o imperialismo e a burguesia e implementar uma saída progressista e popular.

BRASIL: A POLÍTICA EXTERNA PRAGMÁTICA

Na América Latina é difícil um comunista se dizer oposição a Lula e a Dilma. É compreensível. No imaginário da esquerda latino-americana, Lula é socialista e sua política externa parece anti-imperialista.

O Brasil é a oitava economia capitalista do mundo. No plano político, as lideranças burguesas dividem-se entre as que, de um lado, defendem um Estado promotor de políticas compensatórias e incentivador de um “desenvolvimentismo” capaz de acelerar o crescimento capitalista e pretensamente resolver as desigualdades sociais através do ciclo virtuoso da produção, emprego, consumo e aquelas que, de outro, defendem a ampliação das políticas neoliberais, com mais retirada de direitos dos trabalhadores, mais privatização, mais dependência ao capital financeiro internacional.

Os governos petistas representam os setores “desenvolvimentistas” da burguesia, que querem se expandir e competir no mercado externo, o que pressupõe algum grau de autonomia, não conflitiva, com os interesses norte-americanos.

Navegando entre as contradições interburguesas e interimperialistas, a política externa brasileira é coerentemente pragmática. Ao mesmo tempo em que aceita liderar as tropas da ONU que ocupam o Haiti, a pedido de Washington, ajuda Chávez a vencer o golpe petroleiro e Evo ao golpe separatista.

Com sua eficiente diplomacia, o capitalismo brasileiro vai ganhando mercados. Aos olhos de Washignton, Lula se apresentava como uma alternativa moderada ao “radicalismo” de Chávez e Evo Morales; aos olhos da esquerda latino-americana, se apresentava como aliado, mas que cobra um preço alto pela solidariedade: o aproveitamento de oportunidades na busca de mercados. E é o estado brasileiro, principalmente através de bancos públicos, que alavanca as grandes empreiteiras e monopólios multinacionais de origem brasileira a invadirem e crescerem em várias partes do mundo, sobretudo na América Latina.

Quando o governo brasileiro ajuda a inviabilizar a ALCA ou lidera a criação da UNASUL (União das Nações Sul-Americanas) devemos saudá-lo, pois isto objetivamente contraria os interesses dos EUA. Mas não esqueçamos o outro lado da questão: o Brasil é um contraponto capitalista ao movimento de integração anti-imperialista da região, representado pela ALBA.

A esquerda não pode conciliar e deixar de marcar diferenças com Lula e Dilma, que governam fundamentalmente para o capital, tanto na política externa como na interna. A tarefa principal dos governos petistas é “destravar” o capitalismo, custe o que custar, depredando o meio ambiente e reduzindo os direitos trabalhistas, inclusive com a cooptação de setores do movimento sindical e popular. Aliás, o governo Lula jogou papel importante para cooptar e degenerar a CUT, uma central que já foi combativa, afastando da luta anticapitalista e anti-imperialista na América Latina um enorme contingente de trabalhadores.

Com Dilma, a política externa ainda tende a uma inflexão, cujos sinais são as críticas ao Irã, as mudanças nos quadros dirigentes do Ministério de Relações Exteriores, a abstenção cúmplice na agressão imperialista à Líbia e, sobretudo, a vergonhosa recente visita de Obama ao Brasil.

A vinda do presidente dos EUA ao Brasil foi um gesto forte que marcou um claro movimento de estreitamento das relações entre os dois países. Obama foi o primeiro estadista estrangeiro a visitar o Brasil após a posse de Dilma. Mas não foi uma visita qualquer.

O governo brasileiro montou um palanque de honra para Obama falar ao mundo, em especial à América Latina, para ajudar os EUA a recuperarem sua influência política e reduzir o justo sentimento antiamericano que nutre a maioria dos povos. Nem na ditadura militar, um presidente estadunidense teve uma recepção tão espalhafatosa como a que Dilma lhe ofereceu.

Em verdade, o Brasil esteve três dias sob intervenção do governo ianque, que decidiu tudo sobre a passagem de Obama pelo país. Passamos pelo vexame de agentes da CIA revistarem Ministros de Estado brasileiros, em eventos da visita.

No caso da América Latina, foi um gesto de solidariedade aos EUA em sua luta contra os processos de mudança, sobretudo na Venezuela, Bolívia e no Equador.

A moeda de troca foi um mero aceno norte-americano à pretensão obsessiva do Estado burguês brasileiro de ocupar uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU, um símbolo para elevar o Brasil à categoria de potência capitalista mundial.

Enganam-se os que pensam que existe contradição entre a política externa do governo Lula e a de Dilma, ambas fundamentalmente a serviço do capital. Trata-se agora de uma inflexão pragmática. Após uma fase em que o Brasil expandiu e consolidou seus interesses comerciais em novos “mercados” como América Latina, África, Ásia e Oriente Médio, a tarefa principal agora é dar mais atenção aos maiores mercados do mundo, para cuja disputa segmentos da burguesia brasileira se sentem mais preparados.

O governo brasileiro, durante os três dias em que Obama presidiu de fato o Brasil, não fez qualquer gesto ou apelo aos EUA, sequer de caráter humanitário, pelo fim do bloqueio a Cuba, o desmonte do centro de tortura em Guantánamo, a criação do Estado Palestino, o fim da intervenção militar no Iraque e no Afeganistão.

Debochando da soberania brasileira, Obama ordenou os ataques militares contra a Líbia a partir do território brasileiro.

Os principais objetivos da vinda de Obama ao Brasil foram as reservas petrolíferas do pré-sal e a licitação para a compra de aviões militares.

Cada vez fica mais claro que, no caso brasileiro, o imperialismo não é apenas um inimigo externo a combater, mas um inimigo também interno, que se entrelaçou com os setores hegemônicos da burguesia brasileira. O pacto Obama/Dilma reforça o papel do Brasil como ator coadjuvante e sócio minoritário dos interesses do imperialismo norte-americano na América Latina, como tristemente já indicava a vergonhosa liderança brasileira das tropas militares de intervenção no Haiti.

COLÔMBIA: OUTRA GRANDE DISPUTA!

O imperialismo sabe que não haverá paz na Colômbia e, quem sabe, na América Latina, sem o reconhecimento do caráter beligerante e político das FARC. Sabe também que a solução não poderá ser estritamente militar, pois o conflito colombiano é antes de tudo político, econômico e social.

O imperialismo também precisa derrotar a insurgência, para que não sirva de exemplo. Não podemos esquecer que não são convencionais, mas insurgentes, as forças que resistem ao imperialismo na Palestina, no Iraque e no Afeganistão. Forças armadas convencionais não resistem aos ataques aéreos das grandes potências imperialistas. Dependendo dos desdobramentos da crise do capitalismo, nenhuma forma de luta poderá ser descartada. O direito dos povos à rebelião poderá se transformar em dever.

Mas como é difícil vencer a insurgência militarmente, não só pelo aspecto bélico como também por seu histórico enraizamento no povo colombiano, o imperialismo a sataniza como “narcoterrorista”, tentando isolá-la, inclusive de setores reformistas da esquerda latino-americana, preocupados com a sua votação na próxima eleição.

Mas se não pode derrotar a guerrilha, não interessa ao imperialismo o fim do conflito colombiano, para justificar a luta “contra o narcoterrorismo”, que usa como pretexto para criar mais bases na Colômbia e arredores. A Colômbia está para a América Latina como Israel para o Oriente Médio. É um dos principais receptores de ajuda militar norte-americana. E as FARC não podem entregar suas armas e descer as montanhas, sob pena de um novo extermínio, como nos anos 90, em que 5.000 militantes da União Patriótica foram assassinados pelo estado colombiano, após a assinatura de um “acordo de paz” com a guerrilha para que esta se transformasse num partido político legal!

Para forçar o estado colombiano a reconhecer o conteúdo político, econômico e social do conflito, devemos lutar muito para que a UNASUL chame para si a iniciativa de viabilizar o início de um processo de negociação política, para a qual a liderança do Brasil é fundamental.

As FARC são um fator de resistência à ocupação imperialista da Colômbia e, porque não dizer, da Amazônia.

Para avançar nas mudanças sociais na América Latina e evitar guerras e retrocessos, além da necessidade decisiva de elevar o empenho e a organização dos trabalhadores na luta de classes, há uma tarefa importante: derrotar o principal braço do imperialismo norte-americano em nosso continente, o estado terrorista da Colômbia.

REFORMA OU REVOLUÇÃO?

A crise deveria enterrar as ilusões dos que ainda consideram possível humanizar o capitalismo. Não há mais, como na época de ouro da socialdemocracia, anéis para a burguesia dar aos trabalhadores para não perder os dedos. Aliás, no final do século passado ela já os havia tomado de volta, aproveitando-se da queda da União Soviética. É parte importante das tarefas dos revolucionários o combate sem trégua e conciliação aos reformistas, tão bem definidos por Eustoquio Contreras, em seu livro "Princípios e Valores do Processo Revolucionário":

"O reformismo é uma corrente político-partidária favorável a mudanças graduais e não acredita em mudanças revolucionárias. Ideologicamente os reformistas são pessoas comprometidas com determinados interesses, aos quais defendem diante da possibilidade de serem afetados por qualquer mudança radical. Os reformistas se esforçam para conter as lutas revolucionárias aplicando uma artificial política de conciliação entre as classes com interesses opostos. O reformista colaborara com a burguesia na implementação de reformas parciais, que não afetam os seus interesses de classe, enquanto enganam as classes exploradas com a promessa de reformas, que irão gradualmente resolver os problemas dos oprimidos e explorados."

Marx, na obra O 18 Brumário de Luís Bonaparte, já afirmava que o “caráter peculiar da social-democracia resume-se no fato de exigir instituições democrático-republicanas como meio não de acabar com dois extremos, capital e trabalho assalariado, mas de enfraquecer seu antagonismo e transformá-lo em harmonia”. Segundo Marx, a social-democracia surge na Europa visando promover a transformação da sociedade por um processo democrático, porém, uma transformação dentro dos limites da pequena burguesia.

Não há também mais espaço, no capitalismo cada vez mais globalizado, para ilusões nacional-desenvolvimentistas ou nacional-libertadoras, baseadas em alianças dos trabalhadores com as chamadas burguesias nacionais. Mesmo nos países em que o desenvolvimento das forças produtivas se processa em ritmos mais lentos que nas nações de capitalismo avançado, as contradições de setores minoritários das burguesias nacionais com o imperialismo são residuais, até porque dependem cada vez mais do grande capital e dos monopólios.

Na fase imperialista do capitalismo, ainda mais em meio à sua maior crise, a hegemonia no Estado burguês pertence aos segmentos associados aos grandes monopólios. Quem manda são os grandes capitalistas ligados aos bancos, agronegócio, exportadores de matéria prima, grandes indústrias.

Cada vez mais se acentuará no mundo a contradição entre o capital e o trabalho. Não apenas nos países desenvolvidos ou emergentes, como é o caso do Brasil, plenamente associado de forma subordinada ao imperialismo. É só olhar para países pouco desenvolvidos, como a Bolívia e a Venezuela, para entender a ilusão de alianças com as burguesias nacionais. Vejam a violência da burguesia boliviana, diante de uma revolução que não é socialista, mas ainda democrática e cultural, e o ódio que nutre a burguesia venezuelana frente à revolução bolivariana.

No estágio atual do capitalismo, e sobretudo em decorrência de sua profunda crise, se evidenciará cada vez mais a centralidade do trabalho. Estão sendo jogados no lixo da história todos os mitos construídos pelo neoliberalismo, como o “estado mínimo”, o “livre-mercado” e o “fim da classe operária”.

Ao contrário do que dizem os profetas do fim da história e os reformistas, o proletariado aumenta no mundo, em quantidade e qualidade. As camadas médias se proletarizam. Em todas as partes, sobretudo nos países desenvolvidos, apesar da atual fragilidade e fragmentação do movimento operário e sindical, há grandes possibilidades de a luta de classes se intensificar.

Outra ilusão reformista a ser combatida é a ilusão de transição ao socialismo apenas pela via institucional.

Marx, inspirado na rica experiência da Comuna de Paris, chamava a atenção para a impossibilidade de uma transição revolucionária sem a hegemonia político-militar do proletariado, um poder popular verdadeiramente democrático com o objetivo de varrer as instituições do estado burguês e a hegemonia das classes dominantes.

A tomada do poder político por parte da maioria do povo nunca foi nem será uma concessão generosa das classes dominantes. O sistema de exploração que funde os interesses das chamadas burguesias nacionais com os do imperialismo não “cai de podre” nem pelo passar do tempo. Os exploradores não entregam voluntariamente o poder aos explorados, nem mesmo quando setores representativos destes últimos ganham uma eleição, nos marcos da democracia burguesa. Às vezes, são obrigados, a contragosto, a entregar o governo a setores populares, mas estes só alcançarão o poder com lutas muito duras, acumulando forças e golpeando o estado burguês, utilizando-se de métodos e formas de luta as mais variadas (institucionais e insurgentes), adaptadas às circunstâncias, tendo principalmente em conta a correlação de forças entre as classes em luta.

Seja qual for a via da conquista do poder, o caminho ao socialismo só pode ser pavimentado na mobilização e ação das massas exploradas, sob a direção de uma vanguarda revolucionária.

É fundamental, portanto, a luta sem tréguas contra todas as formas de reformismo, como as teorizações sobre os “novos sujeitos”, o “movimentismo” (cujo maior exemplo é o Fórum Social Mundial), marcado pela aversão à política e aos partidos e pelo privilégio de atuação em ONGs e movimentos sociais os quais, em que pese o fato de alguns deles levantarem bandeiras justas, não compreendem a necessidade da luta global pela superação do capitalismo.

Não é nunca demais lembrar a passagem de Marx e Engels, no Manifesto do Partido Comunista:

“Os comunistas não se rebaixam a dissimular suas opiniões e seus fins. Proclamam abertamente que seus objetivos só podem ser alcançados pela derrubada violenta de toda a ordem social existente”.

DE QUE SOCIALISMO FALAMOS?

A continuidade e o avanço do atual processo de transformações na América Latina e a possibilidade de ele vir a assumir um caráter socialista vão depender principalmente da correlação de forças, do nível de consciência, unidade, organização e mobilização das massas populares.

É correto os revolucionários participarem dos processos de mudanças que se dão em países como Venezuela, Bolívia e Equador, desde que mantenham autonomia e visão crítica, combinando unidade e luta. Para isto, é preciso que os comunistas deixem claro, nesses países, as limitações de conceitos de socialismo tais como “bolivariano”, “cidadão”, “do século XXI”, do “bom viver”.

Na Ideologia Alemã e no Manifesto do Partido Comunista, Marx duela com as adjetivações do socialismo, todas elas de conteúdo reformista.

Estes adjetivos podem até se adaptar à atual fase dos processos revolucionários nesses países, mas não ao socialismo. Até porque em Nossa América, com exceção de Cuba, não há ainda qualquer revolução socialista em curso, mas importantes processos de mudanças, que podemos caracterizar como revoluções nacionais e democráticas.

É necessário relermos os conceitos que nos legaram Marx, Lenin e outros pensadores a respeito do socialismo, para reafirmá-los e os adaptarmos ao mundo contemporâneo. Estes conceitos não foram negados na derrota da experiência de construção do socialismo na União Soviética e outros países do Leste Europeu. Pelo contrário, continuam atuais. Apesar de o saldo da Revolução Russa ter sido positivo, ali foram ignorados ou deturpados vários destes princípios, sobretudo aqueles relativos à democracia operária, que levaram à hipertrofia e ao esclerosamento do Partido e sua fusão (e confusão) com o Estado e as organizações de massa.

Portanto, não se trata de inventarmos “novos” socialismos, como se fosse possível conjugar elementos do socialismo e do capitalismo. Este é um terreno pantanoso, em que se adjetivam o substantivo socialismo até como “moderno” ou “democrático”, como se fosse velho ou antidemocrático.

E não haverá revolução socialista se não se começar a desconstruir o estado burguês e os poderes de fato constituídos pela mídia hegemônica, o aparato policial militar, a justiça. E a transição ao socialismo só será assegurada pela instauração do Poder Popular – a democracia direta e protagônica das massas – e o estabelecimento de novas relações de produção, com a supressão da exploração do homem pelo homem.

Mas não podemos cair no voluntarismo, deixando de reconhecer as dificuldades por que passam os processos de mudanças na América do Sul. A primeira coisa é reconhecermos que ainda não estamos, objetiva e subjetivamente, em situações pré-revolucionárias. Segundo Marx, a revolução não se dá da noite para o dia e não depende apenas de vontade. É um processo com duração de difícil previsão e não linear, sujeito a retrocessos. .

Esses processos estão atingindo um ponto crucial, que está chegando mais cedo na Venezuela, mas não tardará a chegar na Bolívia e no Equador. Trata-se de um momento de inflexão, em que se apresenta a dicotomia reforma ou revolução.

Há uma certa fadiga nas massas exploradas, pois as mudanças não chegam às relações entre capital e trabalho. Os trabalhadores são portadores de direitos formalizados na constituição e usufruem da melhoria dos serviços públicos, mas não sentem qualquer mudança mais significativa em suas condições de vida e na distribuição de renda.

Essa é uma limitação de revoluções nacionais e democráticas hegemonizadas por setores da pequena e média burguesia e não pelo proletariado; portanto, reformistas. A maior virtude de processos como estes é que tornam evidente a luta de classes, contrapondo os interesses do capital aos do proletariado, dos trabalhadores e de setores das camadas médias. Isto não ocorre em processos mitigados, de conciliação de classe, como no Brasil, em que os governos e os partidos ditos de esquerda que lhes apóiam não mobilizam as massas e não enfrentam ideologicamente o capitalismo.

A maior debilidade desses processos é a falta de instrumentos políticos e organizações de massas que impulsionem as mudanças no sentido da revolução permanente, verdadeiramente socialista, que vá na direção da constituição do duplo poder e da ruptura com o estado burguês.

* Ivan Pinheiro é Secretário Geral do PCB (Partido Comunista Brasileiro)

Palestra em seminário sobre Marx, em Maracay (Venezuela), organizado pela Prefeitura de Girardot, a Frente Alfredo Maneiro e o Movimento Continental Bolivariano.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Quando meias palavras transformam uma meia verdade em mentira.

Por Maria Fernanda Araújo e Otávio Marhofer Dutra*

Em resposta ao texto: “Vamos cercar de solidariedade os trabalhadores e o povo cubano” publicado pela LIT-QI e pelo PSTU.

Somos estudantes brasileiros em Cuba, país irmão no qual vivemos há quatro anos, e escrevemos este texto a fim de solidarizar-nos verdadeiramente com nossos hermanos e de contribuir sobre a reflexão quanto ao processo revolucionário cubano.

Confessamos que num primeiro momento a leitura do referido texto causou tamanha indignação, diante de tantos equívocos e disparates sobre uma realidade a qual estamos tendo a incrível oportunidade de vivenciar. No princípio, nos questionamos sobre as reais intenções deste texto. Longe de ser uma análise concreta sobre a realidade cubana, acreditamos que o texto da LIT não supera uma visão superficial, fragmentada e idealista de um complexo processo, impossível de compreender em poucos dias de viagem pelos rincões turísticos do país.

Essa é uma questão fundamental: para realizar qualquer discussão ou análise sobre a Revolução Cubana é necessário antes despir-nos de dogmas e preconceitos, compreendendo-a por si própria em sua diversidade. Os únicos pressupostos pelos quais devemos orientar-nos são que a realidade é dialética, e portanto contraditória e dinâmica, de maneira que toda transformação contém elementos do passado e embriões do futuro; e que é necessário ser radical, ou seja, compreender seus problemas a partir das suas raízes.

Sobre os caminhos históricos desde o triunfo de 1959

Sem a ciência da história ao nosso lado - buscando compreender sua dinâmica e seu movimento, sem cair nas facilidades das dicotomias ou dos atos de fé - podemos realizar análises equivocadas, seja pela ingenuidade, ignorância ou pelo oportunismo. No texto da LIT as falsas dicotomias entre bem ou mal e certo ou errado são tratadas como verdades absolutas e os sentidos comuns são o que há de mais freqüente. Assim cabe a nós fazer uma breve reflexão histórica, em que por razões dos objetivos do texto trataremos de 1959 aos dias de hoje.

Com o triunfo da revolução em primeiro de janeiro de 1959, à medida que avançavam as conquistas do heróico povo cubano, crescia também a contra-ofensiva do império. Ainda em 1961, a CIA financia e organiza o ataque de 1200 mercenários a Playa Girón, cujas tropas foram derrotadas pelo povo combatente. Foi então que para organizar o povo cubano e defender suas conquistas foram criados os Comitês de Defesa da Revolução – CDR, possibilitando a construção do socialismo e da democracia popular em cada bairro.

Em 16 de abril de 61, Fidel declara o caráter socialista da Revolução Cubana e com a vitória de Playa Girón, que cumpre 50 anos este 19 de abril, o governo revolucionário realiza mais expropriações de empresas estratégicas e planificação do Estado. Depois desse, vieram muitos outros ataques, que seguem até os dias de hoje. Como se não bastasse, em 1962 os EUA expulsam Cuba da Organização dos Estados Americanos - OEA, e declaram o bloqueio econômico à ilha socialista, buscando impedir que outros países comercializem ou desenvolvam qualquer tipo de relação com este país. Com o bloqueio genocida, Cuba estreita suas relações com a União Soviética, através de acordos comerciais, militares e de solidariedade.

A partir da vitória de 61, os feitos da revolução cubana seguiram impressionando. Em poucos anos Cuba desenvolve-se como potência científica em diversas áreas, como a medicina e a farmacologia. Torna-se o país com maior expectativa de vida e menor mortalidade infantil das Américas, números comparáveis aos mais desenvolvidos países europeus. Desenvolve-se no âmbito dos esportes e cultural, sendo, por exemplo, o país de todo mundo com o maior percentual de escritores per capita, mostra do nível intelectual alcançado pelo povo durante o socialismo. Nas artes plásticas, na dança, na música, no cinema e no teatro a revolução deixou também sua marca: um povo culto é um povo livre, parafraseando José Martí.

O povo cubano em sua grande maioria, ao contrario do que afirma a LIT, é extremamente crítico e conhecedor da sua história e da história dos outros povos do mundo, atualizado como nenhum outro sobre a conjuntura e os desafios dos processos que vivem os oprimidos em qualquer parte. É, sobretudo, um povo ativo e autônomo, soberano e independente, pouco passível às manipulações e ilusões de falsas verdades.

Pátria é humanidade: o internacionalismo de Cuba

Seguimos utilizando a história como instrumento para compreender outros disparates do texto da LIT, que peca pela ausência de base científica. O texto afirma que “a direção cubana implementou a mesma política que tiveram as direções da URSS, China, Alemanha Oriental etc.: a coexistência pacífica com o imperialismo, ao invés da revolução latino-americana e mundial”. O socialismo cubano, como a história prova, não acabou em si mesmo e muito menos coexistiu pacificamente com os EUA, como brevemente relatamos acima. Os cubanos deixaram marcas de emancipação em diversos países e internacionalizaram sua revolução mais do que qualquer outra. Um país pobre, de pequenas extensões geográficas e bloqueado economicamente por grande parte do mundo, jamais hesitou em solidarizar-se com um povo irmão. Desde a década de 60 aos anos 90 apoiou direta ou indiretamente as tentativas emancipatórias na América Latina, exportando sua experiência de guerrilhas, treinando militantes política e militarmente, ou apoiando financeiramente e com recursos humanos diversas organizações e governos revolucionários. Bolívia, Chile, Brasil, Argentina, Uruguai, Colômbia, Venezuela, El Salvador, Peru, Nicarágua, Guatemala, México são alguns dos exemplos na América Latina. Na África contribuíram com exércitos e profissionais diversos aos esforços de libertação nacional de várias nações, como Angola, Etiópia, Congo, Moçambique (e muitos outros) sendo sua participação fundamental para o fim do regime Apartheid na África do Sul.

Desde o triunfo da revolução já somam centenas de milhares os jovens oriundos de países da periferia do sistema que receberam cursos universitários em Cuba; dezenas de milhões os que foram alfabetizados por cubanos e cubanos; milhões os que voltaram a enxergar através cirurgias de catarata realizadas pelas missões médicas cubanas; dezenas de milhões que receberam atenção médica cubana nas mais diversas áreas, seja em desastres ambientais, epidemiológicos (como recentemente o terremoto e a epidemia de cólera no Haíti) ou para estruturar os sistemas nacionais de saúde e educação. Detalhe, Cuba realiza o que considera um princípio – a solidariedade – sem exigir nada em troca. Pelas proporções dos seus gestos, jamais houve tamanho internacionalismo. Quem diga o contrario ou desconhece profundamente a história ou bem intencionado não está.

Hoje, mesmo enfrentando tantas dificuldades econômicas, Cuba segue sendo vanguarda no que se refere à solidariedade internacional. Um exemplo é que atualmente estudam em Cuba cerca de 50 mil estudantes estrangeiros, dos mais diversos cursos universitárias, sendo a maioria medicina. Além disso, as missões cubanas de solidariedade na área de saúde e educação estão presentes em mais de 70 países. Somente na Venezuela são mais de 35 mil cubanos, entre médicos, profissionais da saúde e educadores.

Outro relevante exemplo do internacionalismo do socialismo cubano é o projeto Escola Latino Americana de Medicina - ELAM, idealizado pelo Comandante Fidel Castro em um momento em que toda a América Central havia sido assolada por três furacões. O projeto ELAM já possui 12 anos de existência, com uma grande quantidade de médicos atuando em toda a América Latina. Atualmente, cerca de 700 brasileiros estudam em Cuba, outros 400 já se formaram, e em sua maioria estão comprometidos em trabalhar para construir um SUS 100% público, estatal, universal, integral e eqüitativo para o povo brasileiro, em que a gestão popular seja o principal instrumento de controle e planificação, a exemplo do que vivenciamos diariamente em Cuba.

A desintegração da URSS e as contradições atuais

Seguindo os caminhos da história chegamos no período de desintegração da URSS e do bloco socialista. Na década de 80 recordamos que os acordos com o campo socialista passaram a responder por 85% do intercambio de mercadorias realizadas por Cuba, aprofundando a dependência econômica. Na década de 90, com a desintegração da URSS e do socialismo no leste europeu, teve inicio uma das épocas mais difíceis da história do aguerrido povo cubano: o período especial.

No primeiro ano após a dissolução do campo socialista do leste europeu e da União Soviética, o produto interno bruto decaiu 33%. A questão energética foi uma das mais prejudicadas, colapsando o transporte e a indústria. Cuba infelizmente possui reservas muito pequenas e de difícil acesso de recursos como o Petróleo ou carvão mineral. Um exemplo do caos energético gerado foram as muitas safras de alimentos que apodreceram no campo, já que sem combustível para o transporte não podiam ser deslocadas às cidades. Faltavam alimentos, remédios e outros produtos essenciais, como de vestuário e higiene. Nesse contexto, o cruel bloqueio imperialista tornou-se ainda mais perverso. Mas para a LIT tudo segue preto ou branco e, ignorando a lógica marxista, simplifica superficialmente as soluções para problemas tão profundos e complexos.

Mesmo com tamanhas dificuldades, em pleno período especial, o povo cubano ratifica sua vontade de seguir construindo o socialismo em plebiscito nacional, com mais de 90% dos votos e uma participação de quase 100% da população, com voto secreto, não obrigatório e universal aos maiores de 16 anos. Talvez, por tão heróica resistência e convicção do rumo escolhido, que Fidel considera o Período Especial “o mais glorioso dos 50 anos da Revolução Cubana”.

O povo cubano viveu anos de profunda escassez e sacrifícios. De fato, a dependência econômica que mantinha do campo socialista era profunda, o que se mostrou um grande equivoco na construção do socialismo em Cuba, talvez o maior que cometeram. As seqüelas da dependência se mostraram mais perversas no período especial, o país entrou em colapso. No entanto, julgar a história desde o futuro é fácil. As autocríticas da direção do Partido Comunista e das organizações de massa do povo cubano foram muitas e periódicas, mas não transformam o passado. Servem principalmente para evitar que erros similares voltem a ocorrer.

O período especial gerou também uma serie de novas contradições cujas soluções são hoje, junto com o desafio de dinamizar a economia, os principais desafios para o avanço do socialismo em Cuba. Para reverter o processo de carência e dependência econômica criaram-se diversas empresas mistas (parcerias entre o Estado - sócio majoritário – e empresas capitalistas), com a finalidade de ampliar a infra-estrutura industrial, aumentar e diversificar a produção de bens de consumo para a população. Para incrementar a arrecadação do Estado, Cuba foi obrigada a abrir-se ao predatório turismo internacional e, para isso, fazer concessões as grandes redes turísticas, que detém o monopólio do turismo na Europa e América do Norte, de onde vem o grande contingente de turistas a Cuba. O povo cubano não teve escolhas, porque infelizmente a história não depende somente dos desejos, e os cubanos sabiam em que barco estavam entrando e os problemas que estavam por surgir. Mas para a LIT a resposta continua simples e se resume na seguinte fórmula: Cuba restaurou a economia de mercado.

Com tais medidas, Cuba pôde evitar a ofensiva da contra-revolução capitalista, como ocorreu nos países do antigo bloco socialista. Admirável é a convicção com que LIT defende essas contra-revoluçoes financiados pelo imperialismo, que deterioram a vida de milhões nesses países, como revoluções sociais. Através do controle do Estado sobre as principais empresas estratégicas, planificação da economia e a manutenção das mais importantes conquistas da revolução nas áreas da saúde, educação, arte e cultura e produção de ciência e tecnologia Cuba pode resistir a tal contra-ofensiva. No entanto, este longo período de dificuldades materiais foi bastante marcante na determinação da consciência social. Um grande contingente de cubanos deixou o país durante os anos do período especial, e problemas como a prostituição, o mercado negro e a corrupção, tornaram-se presentes. As desigualdades internas foram intensificadas, especialmente quanto à valoração do trabalho.

Com o objetivo de proteger a população e garantir o mínimo necessário para que todo cubano pudesse seguir vivendo dignamente foi criada uma economia interna “fictícia”, com desvalorização da moeda e forte subsidio do Estado Cubano aos produtos essenciais. Assim, com o período especial foram criadas duas moedas: o Peso conversível (equivalente ao dólar), utilizado nas transações comerciais internacionais e no turismo; e o peso Cubano (que equivale a 1/24 de peso conversível), utilizado no mercado interno de produtos subsidiados pelo Estado.

Todo trabalhador cubano recebe seu salário em peso cubano, e compra seus alimentos e produtos de primeira necessidade com valores muito abaixo do mercado internacional. O salário mínimo é de cerca 400 pesos cubanos, equivalentes aos 18 dólares relatados no texto da LIT. Mas, o essencial que omitiu é o real poder aquisitivo do peso cubano internamente. Exemplifiquemos. O quilo do arroz e do feijão custam 2 pesos cubanos, equivalente a 15 centavos de real para o cubano. O litro do leite custa menos de 1 peso cubano e é gratuito para as crianças de até 10 anos e idosos com mais de 60. A tarifa de ônibus vale 40 centavos de peso cubano (equivalentes a 3 centavos de real) e o pagamento é opcional. Uma sessão de cinema, teatro ou ballet não passa de 40 centavos de real, ou 5 pesos cubanos, isso quando não são oferecidos os freqüentes descontos aos trabalhadores ou estudantes. Agora façamos as contas: algum cubano “passa fome”?

Contudo, um trabalhador que recebe seus ganhos em Peso conversível (em geral aqueles que trabalham em setores vinculados ao turismo, como um taxista particular, alguém que recebe dinheiro de um familiar no exterior ou que aluga um quarto para estrangeiros), já que esta moeda tem um valor 24 vezes maior que o peso cubano, têm maiores possibilidades de consumo que um exemplar operário, um engenheiro, um médico ou um reconhecido professor universitário. Um problema que já é grande por si só é amplificado pelas informações equivocadas da LIT, quando afirma que “os cubanos que trabalham nas empresas internacionais não têm a proteção do Estado “socialista” cubano. Ao contrário, o trabalhador cubano não recebe o mesmo salário que essas empresas pagam em outras partes do mundo. Os cubanos só ganham os seus miseráveis 18 dólares mensais”. Basta informar-se minimamente para rebater esta falácia.

O Estado Cubano recebe pelo trabalho de qualquer cubano de uma empresa mista um valor próximo à média que recebe um trabalhador com semelhante capacitação em qualquer lugar do mundo. Dependendo da função do trabalhador e de sua preparação técnica repassa cerca de 10% desse salário. Um engenheiro de uma empresa mista com um salário em torno de 3 mil dólares recebe cerca de 300 dólares do Estado, que utiliza os outros 2700 para financiar os gastos sociais. Com 300 dólares um trabalhador cubano tem a possibilidade de viver confortável e dignamente em Cuba.

No entanto contradições como essa têm sido um dos maiores desafios do Estado cubano, do Partido Comunista e das organizações de massa do povo. A fim de avançar na superação delas, o governo revolucionário tem proposto à população uma série de reformas que visam principalmente aumentar a produtividade de setores estratégicos (especialmente àqueles vinculados à alimentação e o desenvolvimento de meios de produção). Uma delas trata da legislação trabalhista e objetiva aumentar a produtividade industrial e a agilidade dos serviços, por meio de incentivos materiais aos trabalhadores mais dedicados e comprometidos com a revolução.

Tal medida vem no sentido de reafirmar o principio socialista de “receber de acordo com seu próprio trabalho e esforço”, rumando assim no sentido de diminuir a burocratização dos serviços e a corrupção, que estagnam a produção. Outra importante medida adotada recentemente é a distribuição das terras ociosas do Estado aos pequenos agricultores e a garantia de condições para produzir, com o objetivo de aproximar Cuba da soberania alimentar, com aumento e diversificação da produção agrícola. Este é um dos grandes desafios de Cuba: manter os trabalhadores na terra.

Tendo em vista a ampla especialização da força de trabalho no país, em virtude do acesso irrestrito à educação, atualmente em Cuba faltam agricultores, trabalhadores técnicos, e sobram especialistas universitários a um ponto que em muitos setores da economia parte significativa da força de trabalho não está vinculada diretamente à produção. Com isso, por resolução do Conselho de Ministros da Assembléia Nacional do Poder Popular, debatida em todas as instâncias da sociedade cubana e movimentos de massa, tem sido realizada a redistribuição, e não a demissão como insiste erroneamente a LIT, dos trabalhadores nos diferentes setores da economia, de maneira que em cada local de trabalho pelo menos 80% dos trabalhadores sejam vinculados diretamente à produção, de maneira a aumentá-la e diminuir a burocracia do estado. Para atender à demanda de trabalhadores que não queiram ser redistribuídos, o Estado cubano aumentou a rede de serviços, ampliando a possibilidade de abertura de pequenos negócios (como cafeterias, restaurantes, cabelereiros, aluguel), assim como a ampliação de vagas em cursos técnicos.

Outro equivoco, por omissão de parte da verdade, é quando diz que “a maioria dos produtos que faziam parte da caderneta de abastecimento foi eliminada, ao mesmo tempo em que se anuncia o fim da própria caderneta”. Isso realmente tem acontecido, no entanto os produtos têm sido redirecionados aos setores sociais mais desfavorecidos. O fim do igualitarismo é uma das metas em curto prazo, já que isso não é um princípio socialista. Se é fato que a sociedade cubana hoje apresenta níveis de desigualdades (em proporções abismalmente distintas de qualquer sociedade capitalista) é dever do Estado socialista buscar um resgate do equilíbrio. Esse é um dos atuais objetivos. A caderneta pode num futuro deixar de ser universal para atender mais e melhor aos que mais precisam. Além disso, o texto da LIT diz que “na maioria das empresas os refeitórios foram fechados”. Ao contrário: os trabalhadores estão recebendo um incremento diário de cerca de 15 pesos cubanos e foram abertos restaurantes nas mesmas empresas que servem refeições de 5 a 15 pesos cubanos, com comidas de melhor qualidade, menos desperdícios e corrupção. O texto da LIT é repleto de meias palavras.

Agora, quando afirmam que “as belas crianças cubanas não tem brinquedos. Não poucos brinquedos. Sem brinquedos. É que os brinquedos são proibidos” parecem estar brincando. Não apenas tem brinquedos, como brincam durante todo o dia, e estão bem alimentadas. Aliás, 100% delas estão nas escolas, que é obrigatória até os 14 anos, em que as aulas iniciam às 8h e terminam às 16h. As crianças recebem alimentação e toda a atenção pedagógica durante esse período e não existe perspectiva alguma de acabar com “o período integral nas escolas”. Nenhuma criança cubana trabalha. Elas apenas estudam e brincam. Se para a LIT os brinquedos tem que ser os caríssimos brinquedos das grandes indústrias capitalistas e do consumismo ou um vídeo game de última geração e não apenas objetos para divertir e incentivar a criação e a imaginação da criança então, e somente assim, poderíamos afirmar que em Cuba as crianças não tem brinquedos.

Democracia em Cuba: o povo no poder

O texto da LIT afirma que em Cuba existe “uma ditadura muito similar às piores e mais sanguinárias ditaduras do mundo”. Uma prova disso deve ser o fato de que Cuba é o país da América Latina com a menor taxa de homicídios do continente e uma das menores do mundo. Ou que é o país do nosso continente com o menor proporção de presos e prisões.

Vejamos, então, como é a estrutura de poder nesta ilha socialista. A estrutura de poder em Cuba inicia desde baixo, desde cada quadra: os CDR’s (Comitês de Defesa da Revolução). Estes têm função de garantir a segurança, a limpeza, a organização e convivência coletiva. O conjunto de CDR’s forma a Circunscrição, formada por cerca de 2 mil cubanos. Cada uma delas realiza Assembléias Comunitárias periódicas para debater desde as questões mais relevantes do bairro até os mais importantes temas da economia nacional. A presença nas assembléias não é obrigatória, mas é difícil chegar numa em que não exista ao menos um representante por família. Inclusive as crianças têm direito a expressão, e o utilizam intensamente. Nessas assembléias se indicam os candidatos do bairro para delegados da Assembléia do Poder Popular Municipal, órgão máximo a nível do município. Por voto livre, universal (aos maiores de 16 anos), secreto e não obrigatório elegem os delegados. Todos os cubanos e cubanas podem se candidatar, desde que maiores de idade. Os candidatos podem anunciar sua própria candidatura nas reuniões públicas realizadas nos seus bairros, ou serem indicados por organizações de massas (estudantes, trabalhadores, mulheres etc.).

O Partido Comunista Cubano não indica nem escolhe candidatos. Depois, os cubanos escolhem os candidatos a delegados da Assembléia Provincial, por indicação das organizações de massas e das Assembléias Municipais e os deputados da Assembléia Nacional, em que os candidatos são indicados pelas mesmas organizações. As eleições para a Assembléia Municipal ocorrem a cada dois anos e meio. Já os pleitos para a Assembléia Provincial e a Assembléia Nacional são realizados a cada cinco anos.

As Assembléias do Poder Popular - APP são a máxima estrutura do poder a nível Municipal, Provincial ou Nacional. Entre seus representantes são divididas as funções executivas do Estado, em que apenas se executam as deliberações da APP. Todos os delegados ou deputados podem ter seu mandato revogado a qualquer momento pela base que representam. Nenhum recebe nem um centavo a mais pelo cargo, recebe o mesmo salário que tinha antes de ocupar a função.

As campanhas eleitorais são feitas por meio de um cartaz padronizado, em que todos os candidatos têm o mesmo espaço para expressar suas idéias e sua biografia. Os cartazes são colocados nos principais locais de movimentação do povo, publicados nos jornais de circulação massiva e divulgados na televisão, com o mesmo tempo e formato gráfico.

O presidente de Cuba não passa de mero executor das deliberações da APP Nacional, não tendo qualquer poder para além dessa. Antes de tudo, como qualquer outro membro da APP Nacional, o presidente de Cuba deve ser eleito deputado. Fidel, nas últimas eleições foi eleito deputado com cerca de 97% do votos em sua província e Raul Castro com 98%. Os dois tiveram iguais condições de apresentar sua candidatura que qualquer outro candidato.

Vale esclarecer que o Partido Comunista Cubano não cumpre nenhuma função de Estado, e todos suas posições, para tornarem-se realidade, devem ser construídas junto ao povo, que pode ou não reconhecer as posições do PCC como as mais acertadas. Caso não exista o convencimento do povo pelo Partido as políticas simplesmente não são aplicadas.

Dessa forma, consideramos que a comparação do nível da democracia cubana com qualquer “democracia” ocidental, deve ser bastante cuidadosa, já que em tais democracias o poder do povo está restrito ao voto, absolutamente manipulado pelos interesses econômicos e pelo monopólio da mídia, em que são os partidos da ordem e as classes dominantes, e não o povo, quem ditam as regras. Já a comparação da democracia cubana com “as piores e mais sanguinárias ditaduras do mundo”, em coro com o discurso de Bush ou Obama, para nós que vivemos há 4 anos nesta ilha e participamos ativamente dos instrumentos democráticos construídos pelo povo cubano, é sem dúvida a maior de todas as mentiras expressadas pela LIT em seu texto.

Acesso à informação

Os ataques imperialistas não cessam, mesmo o texto da LIT afirmando que a convivência é pacífica. O assassino bloqueio segue vigente, mesmo com as sucessivas votações contrárias nas assembléias da ONU, em que apenas 3 nações do mundo se mantêm favoráveis a sua continuidade. Os prejuízos para Cuba são incalculáveis: em apenas 8 horas de bloqueio o governo cubano poderia reparar cerca de 40 creches ou em 1 dia comprar 139 ônibus de transporte urbano. O caso dos cinco heróis cubanos é outro exemplo da desumanidade que impõe o monstro do norte - como definia Simon Bolívar – presos por lutar contra o terrorismo dos EUA.

É parte verdade o que diz o texto da LIT: nenhuma organização cubana votou pela proibição do acesso à internet. Sua restrição – e não sua proibição – é outro exemplo da ação do bloqueio estadunidense em Cuba, pois o monopólio e bloqueio do acesso a sinal de internet desde de satélites ianques, e pelos cabos que passam pelo Caribe fazem com a banda total de internet de Cuba seja menor do que uma Universidade Federal do Brasil, restringindo seu acesso aos trabalhadores em seus locais de trabalho (governo, escolas, hospitais, policlínicas), hotéis, Joven Clubs (espécie de lan house) e a residência de profissionais especializados. Essa situação se espera que melhore logo que o cabo submarino de fibra ótica que está sendo construído através da ALBA desde Venezuela chegue a terras cubanas.

Quanto ao acesso à informação no país, é verdade que o Granma é o órgão de informação oficial do Partido Comunista Cubano, que é distribuído em todo o país. Mas o/a autor(a) do texto esqueceu de informar sobre as outras dezenas de publicações especializadas, políticas, culturais e de lazer publicadas em todo o país, por organizações populares, nas quais as criticas e autocríticas ao processo revolucionário são freqüentes, quase cotidianas. E bem se vê que o/a correspondente da LIT aproveitou bastante sua viagem pelo Caribe e sequer teve um tempinho de assistir à televisão recheada de programas, filmes e documentários nacionais e das maiores redes de televisões do mundo em canal aberto e estatal, sem espaços para propagandas comerciais. Infelizmente, talvez não pôde aproveitar os debates com especialistas cubanos e de outros países sobre a situação no Oriente Médio, ocorridos no programa Mesa Redonda, que diariamente enfoca temas de importância nacional e internacional em horário nobre. Ou assistir na televisão os jornais diários, ou ler algumas das reflexões do companheiro Fidel e de muitos outros intelectuais cubanos sobe o assunto, publicadas tanto no próprio Granma quanto em periódicos internacionais e na internet.

Dessa forma afirmamos categoricamente que a LIT se equivoca quando diz que “o governo e o Partido Comunista Cubano (...) não permitem que chegue, por meio da televisão ou da rádio (ambas controladas pelo governo), qualquer tipo de informação sobre o que as massas estão fazendo nos países árabes”. Para verificar a verdade não é necessário muito esforço, nem estar em Cuba, basta entrar nos inúmeros sites cubanos (inclusive das redes de televisão e rádio) que informam sua própria população e o mundo sobre o processo que vivem os povos árabes.

As estatísticas não mentem

Segundo o texto, o cubano vive no pior dos mundos (...). A partir da revolução, Cuba transformou-se no país mais igualitário da América, mas hoje é exatamente o contrário. Certamente, Cuba tornou-se o país mais igualitário das Américas, e quiçá as contradições surgidas com o período especial possibilitaram o surgimento de algumas diferenças sociais. Contudo, engana-se quem afirma que Cuba perdeu seu status de país mais igualitário da América, e isso percebemos cotidianamente: em Cuba, você jamais verá uma criança pedindo esmola. Pelo contrário, você encontrará inúmeros jovens brasileiros e demais latino-americanos e caribenhos, ex-crianças de rua, sem terra ou sem teto, tendo a possibilidade de estudar medicina, além de outras carreiras como engenharia, agronomia, arte, educação física, pedagogia. Jovens estes originários de países em que o acesso à educação, saúde, moradia e cultura é ainda limitado, mesmo sendo uma das dez maiores economias do mundo, como é o caso do Brasil.

Isso é visível nos dados sócio-econômicos sobre Cuba, publicados e disponíveis em sites de organizações de referência internacional, como a Organização Mundial da Saúde ou da ONU. Nestes 50 anos de Revolução, mesmo diante de condições econômicas diversas, Cuba atinge taxas de Índice de Desenvolvimento Humano e de expectativa de vida invejáveis. O Brasil, por exemplo, que possui o oitavo maior Produto Interno Bruto do Mundo (estimado em US$ 1,995 trilhões em 2007, e um PIB per capita de US$ 10.296), possuía no mesmo ano o 75º IDH do mundo, e tinha uma media de expectativa de via em 72,4 anos (92º no ranking mundial). Enquanto que Cuba, no mesmo período, sendo a 85ª economia (PIB de US$ 51,11 bilhões, e um per capita de US$ 4,5 mil), era o 51º em IDH (o,86) e 37º em expectativa de vida (78,3 anos).

Outro indicador importante, oferecida pela Oficina Nacional de Estadísticas de Cuba, é a progresão da mortalidade infantil e materna nos últimos anos, assim como os de acesso aos serviços de saúde, conforme segue abaixo.

Evolución de los indicadores de salud. Años seleccionados

Indicadores seleccionados

1960

1980

1990

1995

2000

Tasa de mortalidad infantil (por mil nacidos vivos)

42,0

19,6

10,7

9,4

7,2

Tasa de mortalidad en niños menores de 5 años (por mil nacidos vivos)

42,4a

24,3

13,2

12,5

9,1

Índice de niños con bajo peso al nacer (en %)

...

9,7

7,6

7,9

6,1

Tasa de mortalidad materna (por 100 000 nacidos vivos)

120,1

52,6

31,6

32,6

34,1

Partos atendidos en instituciones hospitalarias (%)

63,0

98,5

99,8

99,8

99,9

Habitantes por médico

...

635

275

193

169

No último ano, Cuba alcançou a cifra de mortalidade infantil de 4,4 para cada mil nascidos vivos. Essa progressão mostra como, mesmo em tão difíceis condições econômicas e de embargo depois de mais de 20 anos do fim da URSS, os indicadores sociais de Cuba continuam melhorando. No mesmo período são diversos os estudos que mostram uma situação completamente distinta nos países do leste europeu em que existiram contra-revoluçoes capitalistas. Os índices de educação e acesso a cultura também estão progressivamente avançando, assim como os indicadores de segurança pública, que ao contrário do mundo se mantém estáveis, com os menores índices de violência do mundo. E como se alcança níveis de IDH e expectativa de vida tão avançados? A resposta é bastante objetiva: oferecendo a sua população possibilidades ao seu pleno desenvolvimento como seres humanos, em condições de igualdade e universalidade de acesso a educação, saúde, cultura, arte e lazer – condições jamais alcançáveis se em Cuba tivesse ocorrido ou ocorrendo a volta do capitalismo.

A solidariedade que o povo cubano necessita: a verdade!

Mas a paciência dos cubanos parece estar chegando ao fim (...)Mais cedo ou mais tarde, os trabalhadores cubanos vão se rebelar contra essa situação”. Quanto a isso a LIT está certa: é verdade que os cubanos já não tem mais paciência com tantas dificuldades. No entanto se equivoca contra o quê e de que forma vão se rebelar. Os cubanos são profundamente rebeldes. E estão rebelando-se contra tudo que está ruim em sua revolução, interna e externamente. As reformas são urgentes, assim como o fim do bloqueio, pois realmente é difícil um país viver tantos anos com tamanhos entraves. Mas a certeza de que o socialismo é o caminho que o povo cubano defende com todas as suas forças foi comprovada na marcha do dia 16 de abril, pelos milhões de cubanos que marcharam por Havana e por toda Cuba em comemoração aos 50 anos do socialismo em Cuba e da vitória de Playa Girón, e que também abriu o VI Congresso do PCC. Neste dia, militares, trabalhadores e estudantes, por livre vontade e convicção - e não por opressão das armas como ocorriam nas ditaduras mais sanguinolentas de América Latina - caminharam juntos, unidos, em defesa da Revolução, do seu governo revolucionário e do socialismo cubano. É possível que milhões (em um país de não mais de 11 milhões de habitantes) marchem alegres e unidos através de mecanismos de opressão?

Para finalizar, muitos insistem em deturpar o caminho escolhido pelo povo cubano, mas os fatos não escondem a verdade: em 51 anos o socialismo humanizou a sociedade cubana. Cuba é o único país das Américas em que a violência, tão crescente no Brasil, é insignificante. Havana, uma capital com quase 3 milhões de habitantes, é tão tranqüila quanto uma pacata cidade do interior, em que assassinatos e seqüestros ficam restritos aos romances policiais.

Cuba é um país que trabalha cotidianamente para superar a desigualdade de direitos entre os gêneros, para superar o racismo, a discriminação por qualquer orientação sexual e tantas formas de opressão, tão enraizadas em nossas sociedades. Outros não cansam de afirmar que a Revolução Cubana é coisa do passado e que o socialismo morreu junto a URSS. Para esses respondemos que não somente é presente o socialismo em Cuba, mas que vem fortalecendo seus princípios e ideais à medida que avançam os processos revolucionários na América Latina. Contudo, a construção do socialismo não depende somente da vontade das pessoas, mas de condições históricas, objetivas e concretas, cuja complexidade vai para além do que está nos manuais ou nos livros, pois a realidade é antes de tudo, dialética.

Revolução é fazer do extraordinário cotidiano. E isso em Cuba é diário, em cada criança que brinca livremente nas praças do país, sem preocupações com tráfico de drogas, assaltos, ou com o ganha pão diário. Crianças de um país pobre e bloqueado economicamente, mas que mesmo assim sabemos que terão todas as condições de desenvolver-se plenamente como seres humanos. Este, independente dos caminhos que se tomem, é fim principal do que entendemos por socialismo.

Cuba e o socialismo nos permitem seguir sonhando com a utopia de um mundo humano, no mesmo sentido em que dedicaram suas vidas tantos mártires nesses 52 anos de revolução. Por eles e pelas gerações futuras o povo cubano jamais abandonará as trincheiras conquistadas.

17 de abril de 2011 - Havana, Cuba

* Maria Fernanda Araújo e Otávio Marhofer Dutra são estudantes de medicina na Universidade de Ciências Médicas de Havana e militantes da base Paulo Petry do Partido Comunista Brasileiro e da União da Juventude Comunista em Cuba, formada por 16 estudantes.

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