As propostas de reforma política em curso fortalecerão a direita mas também criarão para nós possibilidades e necessidades novas, influindo em nossa tática, em nossas bandeiras e estratégias.
É claro, por enquanto são somente balões de ensaio, propostas, propagandas de idéias-força, e devemos esperar a lei ser aprovada para fazer um balanço, e depois teremos que observar um teste prático. Mas isso não nos impede de começar a analisar a situação.
O vice-presidente da República veio a público lançar a idéia de que as eleições devem deixar de ser proporcionais, sem nem citar a palavra "proporcional" visto que os eleitores não fazem muita idéia do que signifique na lei eleitoral brasileira. Para que os eleitores entendessem o voto proporcional, teriam que votar no partido, ou na coligação, ou na lista de candidatos, e não em candidato por candidato, não em pessoas, como hoje. Isso porque o voto proporcional tem essa lógica - Minas tem hoje 53 deputados federais, então, se uma coligação chega a 1 / 53 dos votos, pouco menos que 2%, dos votos válidos, essa coligação faz um deputado, se chega a 5 / 53 dos votos válidos, elege 5 deputados. Quais 5 ? Os 5 mais votados da coligação! Mas os eleitores não sabem de nada disso, e não votam por coligação, ou pior, votam nas coligações sem saberem disso, achando que estão votando somente no candidato.
Quando Michel Temer vem a público pedir que os votos sejam para os candidatos, e que sejam eleitos os candidatos mais votados nominalmente, a despeito das coligações, de fato está pedindo o fim das eleições proporcionais. Naturalmente, vem junto a demanda da eleição distrital, que é a única forma razoável de se colocar em prática o fim do voto proporcional. Minas Gerais seria dividida para fins eleitorais, por exemplo, em 53 distritos, cada um elegendo um deputado.
Como a mesma reforma já foi feita em diversos países o resultado é indiscutível - o poder financeiro se tornará ainda mais sufocante, os parlamentos ficarão ainda mais conservadores, para não dizer reacionários e autoritários. Basta pensar nas eleições de prefeitos, em como é dominante o poder financeiro, pois os distritos, de forem de 1 deputado cada, deverão englobar em média 10 municípios, dado que são 5 mil e tantos municípios para 500 e tantos deputados. Ou seja, serão campanhas tão caras quanto as de dez prefeituras ou mais no interior, e nas capitais tão caras quanto uma eleição de prefeito.
Contudo, como o povo compreenderá melhor o mecanismo eleitoral, e está ávido por reformas políticas, apoiará essas mudanças com grande esperança. Então, apesar de ser uma reforma política de direita (feita pelo PT), e apesar de termos portanto a obrigação de denunciá-la, teremos também que aproveitá-la da melhor maneira possível. Será natural, por exemplo, que beneficiemos a relação direta entre deputado e eleitorado, que faz parte do espírito do voto distrital. Também poderemos, explorando esse vínculo, defender o maior controle público sobre os mandatos. Em outras palavras, não teremos que nos apegar à defesa do voto proporcional, que aliás também não nos tem sido nada amigável, pois poderemos defender coisas mais avançadas.
Para adoçar, junto com o voto distrital, acena-se com o financiamento público das campanhas, que em todo o mundo capitalista é somente um engôdo, pois não proíbe o financiamento privado, e com uma grande aspiração popular - o voto facultativo! A esquerda brasileira, paternalista (porque mais cristã que marxista) e sempre ultra-inocente, defende o financiamento público como se fosse coisa séria mas é a favor do voto obrigatório, sob a alegação pedagogicamente autoritária de que ele é politizante. Creio que os eleitores que votam no Partido Comunista não diminuirão com o voto facultativo, e que os votos despolitizados sim, diminuirão, em bem da sociedade. Mas sobre o financiamento público, é quase certo que será feito de forma a não nos beneficiar.
Alex Lombello Amaral é historiador e membro do comitê regional do PCB em Minas Gerais.
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